Projectos

Nome:AFFAITATI, João Francisco
Outros nomes:AFFAITADI, João Francisco / LAFETÁ, João Francisco / AFFAITATI, Giovanni Francesco / AFFAITATI, Gian Francesco
Nascimento e morte:Cremona, séc. XV - Lisboa, 1528
Descrição:As origens de João Francisco Affaitati são obscuras. Segundo alguma bibiliografia, seria filho natural ou irmão do conde Ludovico de Cremona. Por sua vez, o conde de la Vauguyon afirma que o biografado era filho de um modesto negociante lombardo. Existiam mesmo rumores de existir sangue judaico nos Affaitati.
Mais claro é o facto dos Affaitati, a partir de João Francisco, se encontrarem entre as proles de mercadores que controlavam as rotas comercias entre o sul e o norte da Europa durante o século XVI, sendo pioneiros no comércio de pedras preciosas. Antuérpia era a sede desses negócios que se disseminavam por outros focos mercantis europeus, nomeadamente, Londres, Roma, Sevilha, Valladolid e Medina del Campo.
João Francisco Affaitati nunca se chegou a casar, embora lhe sejam conhecidos seis filhos: Cosme, Agostinho, Inês e Madalena Affaitati, filhos de Maria Gonçalves, cristã-nova e fanqueira; Lucrécia e Antónia Affaitati, filhas de Branca de Castro, cristã-nova de Setúbal.
Através dos enlaces matrimoniais dos seus filhos, Affaitati consolidou a sua rede de influências e a sua posição social. Afinal, alguns deles casaram-se com elementos da nobreza portuguesa, como foram os casos de Cosme e Agostinho Affaitati, casados com D. Maria de Vilhena e D. Maria de Tavora, e de Inês Affaitati, esposa de D. Leonardo de Sousa. Agostinho foi nomeado trinchante-mor de D. João III.
Foi ainda no decorrer do século XV que João Francisco Affaitati se estabeleceu em Lisboa. Tinha a missão de informar Veneza sobre os resultados das expedições ultramarinas portuguesas, mantendo, assim, uma estreita relação com os representantes da Sereníssima na capital portuguesa, nomeadamente com Pietro Pasqualigo. Quando a frota de João da Nova regressou da Índia, Affaitati escreveu, com data de 10 de Setembro de 1502, uma carta a Pasqualigo, então em Madrid.
Nesse mesmo ano, Affaitati armara uma das naus que partiram rumo à Índia, acompanhando a segunda armada de Vasco da Gama. O seu feitor Matteo di Bergamo seguia nessa nau. Esta viagem foi-lhe particularmente lucrativa segundo revela numa carta escrita a 14 de Setembro de 1503 e dirigida a Domino Lucha e aos seus irmãos em Cremona: “E per quello che noi havemo in ditta nave, parmi che de nostra parte sempre haveremo tante spiziarie vellerano zercha ducati 5000, et lo capital fo ducati 2000, pocho piú [...]”.
Dedicado ao comércio de especiarias, estabeleceu negócios com os cristãos-novos Francisco e Diogo Mendes. Entre 1508 e 1514, os Affaitati e os Gualterrotti, por concessão de D. Manuel, tinham o monopólio da venda de especiarias nos Países Baixos, período durante o qual fizeram contratos no valor de 117 004 880 réis. Juntaram-se a esse contrato outros mercadores italianos, os Fugger e os Welser. O sobrinho Gian Carlo Affaitati e o genro João Carlos Doria eram os seus representantes na Antuérpia.
A 10 de Junho de 1513, D. Manuel renovava por mais um ano o contrato em que Affaitati se comprometia a comprar dois mil quintais de pimenta, por ano, à coroa. Segundo um outro alvará desse mesmo ano, o mercador encontrava-se obrigado a carregar a pimenta para o Levante sem poder vendê-la em Lisboa.
No ano de 1525, João Francisco assinou um contrato com o rei sobre a compra de 13 mil quintais de pimenta a 34,25 cruzados o quintal, 400 quintais de cravo a 50 cruzados, 700 quintais de canela a 65 cruzados e 2 mil quintais de gengibre a 30 cruzados.
Affaitati negociava também no açúcar da Madeira. Eram seus feitores na ilha, Gabriel Affaitati, Luca Antonio, Cristóvao Bocollo, Capella de Capelani, João Dias, João Gonçalves, Matia Manardi e Maffei Rogell.
Em 1502, em conjunto com Jerónimo Sernigi, João Jaconde e Francisco Corbinelli, Affaitati arrematava trinta mil arrobas de açúcar destinadas a Águas Mortas, Livorno, Roma e Veneza. Dois anos depois, celebrava um contrato para a compra de 3500 arrobas e, em 1512, um novo contrato para a compra de seis mil arrobas de açúcar. Passados quatro anos, arrematava os quintos e os dízimos sobre o açúcar branco, contratos que repetiu em 1518, 1520 e 1521, sendo estes dois últimos anos em parceria com Janim Bicudo.
Em suma, entre 1502 e 1529, Affaitati comercializou, através dos seus procuradores, 177907,5 arrobas de açúcar da Madeira, notabilizando-se como o maior negociante desta mercadoria durante aqueles anos.
A 20 de Maio de 1529, Capellan de Capellani apresentava um contrato pelo qual João Francisco era obrigado a comprar todo o açúcar e melaço produzido. Nessa altura, Affaitati já não era vivo mas Lucas Giraldi, seu procurador em Lisboa, aceitou-o mesmo assim.
A sua fortuna e os seus negócios tornaram-no credor da coroa. Em 1509, o rei ordenava que lhe fossem entregues 8283 arrobas e 5,5 arráteis de açúcar em pagamento de diversas dívidas. Num mandado de 28 de Abril de 1528, a rainha ordenava que se pagasse a Affaitati 512400 réis que tinha em dívida.
Dada a prosperidade dos seus negócios, Affaitati desfrutava de uma posição social privilegiada, similar à dos florentinos Sernigi e Marchionni. Foram-lhe mesmo confiados privilégios semelhantes aos que tinham os mercadores alemães.
O prestígio da família continuou com os seus descendentes. Após a sua morte, quem ficou a representar os interesses dos Affaitati em Portugal foi o genro e sobrinho, João Carlos Doria, o qual se casara com a sua filha Lucrécia.
Palavras-chave:Mercador; Comerciante; Informante; Contratador ; Antuérpia; Londres; Roma; Sevilha; Valladolid; Medina del Campo; Setúbal; Lisboa; Veneza; Madeira; Águas Mortas; Livorno; Veneza Madrid; Índia; Cremona; Países Baixos; Açúcar; Especiarias; Pimenta; Gengibre; Canela; Ludovico de Cremona; Vauguyon; Cosme Affaitati; Agostinho Affaitati; Inês Affaitati; Madalena Affaitati; Maria Gonçalves Maria Gonçalves; Lucrécia Affaitati; Antónia Affaitati; Branca de Castro; D. Maria de Vilhena; D. Maria de Tavora; D. Leonardo de Sousa; D. João III; Pietro Pasqualigo; João da Nova; Pasqualigo; Matteo di Bergamo; Domino Lucha; Francisco Mendes; Diogo Mendes; Gualterrotti; D. Manuel; Fugger; Welser; Gian Carlo Affaitati; João Carlos Doria; Gabriel Affaitati; Luca Antonio; Cristóvao Bocollo; Capella de Capelani; João Dias; João Gonçalves; Matia Manardi; Maffei Rogell; Jerónimo Sernigi; João Jaconde; Francisco Corbinelli; Janim Bicudo; Capellan; Capellani
Bibliografia
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Ibidem, parte II, maço 12, n.º 157; maço 13, n.º 115; maço 14, n.º 84; maço 14, n.º 85; maço 16, n.º 30, 38, 120, 130 e 158; maço 17, n.º 129; maço 18, n.º 57 e 95; maço 19, n.º 151; maço 21, n.º 120; maço 27, n.º 85; maço 31, n.º 18, 19 e 34; maço 35, n.º 243; maço 64, n.º 48 e 102; maço 84, n.º 20, 39; maço 88, n.º 16 e 17; maço 120, n.º 88; maço 137, n.º 180; maço 162, n.º 20.
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