31 de outubro e 1 de novembro de 2013, no anfiteatro III da FLUL
RESUMOS DAS COMUNICAÇÕES A APRESENTAR NO COLÓQUIO:
1 – Manuscritos internacionais quatrocentistas em Portugal
Adelaide Miranda / Luís Ribeiro
A construção de um panorama dos manuscritos internacionais que circulavam no Portugal quatrocentista coloca-nos um grande desafio. No estado actual do conhecimentos é difícil avaliar até que ponto os códices iluminados conservados em Portugal estiveram presentes nas bibliotecas ou foram adquiridos por coleccionadores mais tardios (como por exemplo Frei Manuel do Cenáculo e D. Francisco de Melo Manuel). A ausência de monografias sobre os manuscritos e sua circulação dificulta um estudo rigoroso deste tema. Nesta comunicação procuramos estabelecer as tipologias dominantes e as imagens que lhes estão associadas de forma a criar um primeiro esboço do que pensamos ser os manuscritos iluminados que corresponderiam ao gosto das elites portuguesas dessa época.
Sobre os autores:
Maria Adelaide Miranda
Licenciada em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Mestre e Doutorada pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Actualmente é Professora Associada Aposentada. As suas áreas de investigação centram-se na Arte Medieval, nomeadamente nos domínios da cor, iconografia e iluminura. Neste âmbito tem participado em projectos de Investigação interdisciplinares: A cor na Iluminura Medieval e Imago, que pretendem aprofundar e divulgar estes domínios artísticos. É membro da direcção do Instituto de Estudos Medievais e colabora no Instituto de História da Arte, pertencendo ao conselho redactorial das revistas Medievalista on line (IEM) e De Arte (Univ. de León).
Luís Campos Ribeiro
Investigador do Instituto de Estudos Medievais, FCSH-UNL e licenciado em História da Arte pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Actualmente é bolseiro do projecto “Iluminura hebraica em Portugal durante o século XV” e está a preparar um doutoramento em História da Arte sobre iluminura nos livros de ciência medievais.
2 – Ler e contemplar
Aires A. Nascimento
Ler e contemplar… Serão duas operações diferentes? Ou complementares? Na tradição, aparecem confinadas a tempos e locais diferenciados, como diferenciado é o lugar para escrever e o que é destinado à leitura. Parecendo que se banalizou o acesso à leitura, pois até nos lugares mais comuns ela aparece, importará perguntar se a indiferença com que passamos pelos outros é sinal de recolhimento para recolher o que eventualmente ficou do texto que não queremos largar ou se esse refúgio não é mais que um pretexto para distracção mais longínqua e alheada. Distinguir para congraçar, juízo para compreender, na superação de entraves e no reconhecimento de instrumentalidade dos suportes de texto…, enfim, para reinventar a leitura e reanimar um diálogo alargado e construtivo, em que o silêncio não é ausência, mas estudar é esforço e ler é acto prolongado de recolha e reconfiguração interior pela admiração do outro que se nos oferece através do texto da sua autenticidade e apresenta a possibilidade de nos re-inventarmos a nós próprios na identidade que sente o sentido da comunhão: a contemplação é admiração e reconfiguração activa, leitura é operação dinâmica que a escola deve preparar.
Sobre o autor:
Ensinou várias disciplinas na Faculdade de Letras de Lisboa: de formação clássica e filológica de base, integrou projectos vários destinados a recolher textos e estudá-los na dinâmica da sua inserção em comunidades textuais e perceber eventuais derivas causadas; entre outras disciplinas, ensinou Codicologia em diversos cursos de Mestrado e Pós-graduação em várias universidades portuguesas, cabendo-lhe a introdução dessa disciplina entre nós, marcando o seu ensino pelo estudo da funcionalidade do livro como instrumento do texto e recuperação das marcas que revelam a sua orientação para a leitura integrada em comunidades culturais. A sua bibliografia nesse domínio pode ver-se em diversos estudos publicados desde 1978, como vem indicado em currículo divulgado em Ler contra o Tempo, Lisboa, Centro de Estudos Clássicos, 2013. O autor faz parte da Academia das Ciências de Lisboa, secção de Filologia, onde tem o lugar nº 17, em que sucedeu a Américo da Costa Ramalho.
3 – Burlas Hebraicas e verdades latinas. Álvaro de Brito Pestana e as Lamentações de Jeremias
Ana Maria Sánchez Tarrío (anatarrio@campus.ul.pt)
O antijudaismo das trovas a Luís Fogaça de Álvaro de Brito Pestana (c. 1481) singulariza-se pela denúncia do perigoso ascendente dos rabinos contemporâneos sobre os cristãos mais ‘doutrinados’ do seu tempo, em particular Isaac Abravanel, nos anos iminentes à conversão forçada e à expulsão. A espinha dorsal da composição é uma alegoria da cidade de Lisboa, degradada pela peste física e moral, prefigurada na Jerusalém das Lamentationes do profeta Jeremias. O texto encontra elucidativo contraponto na utilização das profecias de Jeremias por parte do próprio Abravanel como prefiguração da expulsão dos judeus da Península Ibérica. As trovas delatam a partilha entre o saber cristão e judaico na Lisboa da viragem para o reinado de D. João II, focando a comunidade de cristãos hebraístas ou doutrinados pelos judeus, e lançando interrogantes sobre os possíveis materiais de mediação (traduções latinas ou vernáculas do hebraico).
Sobre a autora:
Professora Associada com Agregação do Departamento de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É autora do livro Paisagem e erudição no humanismo português (Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2009), e de outros estudos sobre o Cancioneiro Geral de Garcia de Resende e o papel do humanismo latino e da tradição clássica na cultura portuguesa quinhentista, particularmente nas obras de João Rodrigues de Sá de Meneses, Duarte de Resende, Martim de Figueiredo, Dr. João de Barros, Fernando Oliveira.
4 – As tábuas astronómicas de Abraão Zacuto e as navegações oceânicas
António Costa Canas (costacanas@gmail.com)
Neste texto falaremos sobre os contributos de Abraão Zacuto para o desenvolvimento da navegação astronómica em Portugal. Começaremos por apresentar, de uma forma bastante sucinta, a evolução da náutica portuguesa, em finais do século, de modo a compreendermos a necessidade de desenvolvimento de novas técnicas de navegação. Esta nova prática de navegar implicou a colaboração de astrónomos, tendo sido fundamental a contribuição de vários astrónomos de origem hebraica, nomeadamente Abraão Zacuto e José Vizinho.
A nossa explicação procurará identificar os diferentes problemas que foram sendo detetados, na transição de uma náutica de origem mediterrânica, suficiente para percursos relativamente curtos, para uma náutica oceânica, na qual os navios passavam longos períodos sem avistar terra. Após a identificação de cada problema explicaremos a solução para ultrapassar o mesmo.
Após identificação dos problemas fundamentais que foram sendo ultrapassados, passaremos a expor o contributo de alguns dos astrónomos que contribuíram para a evolução da arte de navegar. A nossa atenção centrar-se-á em Zacuto, apresentando uma breve biografia do mesmo, seguida dos seus contributos.
Sobre o autor:
Oficial da Marinha, sendo atualmente diretor do Museu de Marinha. Concluiu o doutoramento em especialidade de Descobrimentos e da Expansão Portuguesa, pela Universidade de Lisboa. Membro do Centro Interuniversitário de História das Ciências e da Tecnologia, do Centro de Investigação Naval e da Direção do Seminário Nacional de História da Matemática. Secretário do International Committee for the History of Nautical Science. Integra a Comissão Científica responsável pela edição das Obras de Pedro Nunes, no âmbito da Academia das Ciências. Cerca de três dezenas de textos publicados entre livros, capítulos de livros e artigos em revistas, atas de congressos e colóquios. Principais áreas de interesse: história marítima e história da ciência.
5 – ‘SephardiPal’: entre as letras e formas dos manuscritos sefarditas tardo-medievais
Débora Matos
Considerando a história recente do livro hebraico, observa-se um interesse crescente pela aplicação de novas tecnologias ao seu estudo, designadamente em termos de paleografia, não só por parte de investigadores tradicionalmente da área das humanidades, como também da área da computação. O diálogo metodológico tem aberto portas para novas possibilidades de investigação que, no entanto, não obliteram o papel do historiador/paleógrafo. Atualmente a ser desenvolvida na King’s College London, ‘SephardiPal’ é uma ferramenta e base de dados que permite a anotação, descrição e comparação de imagens, a análise morfológica de caracteres e elementos decorativos em detalhe e que possibilita o cotejo de grandes quantidades de informação. Partindo de dois casos concretos, os manuscritos da ‘Escola da Andaluzia’ e da ‘Escola de Lisboa’, proponho-me descrever os desafios atuais da minha investigação sobre a mobilidade de escribas judeus na Península Ibérica na segunda metade do século XV, e como ‘SephardiPal’ tem sido determinante no processo de obtenção de dados.
Sobre a autora
Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (2003). Mestre em Arte, Património e Teoria do Restauro pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (2011), com a tese The Ms Parma 1959 in the context of Portuguese Hebrew illumination. Doutoranda no King’s College, onde desenvolve uma dissertação dedicada ao tema Hebrew book production in Portugal: influences and offshoots.
6 – A iluminura portuguesa no século XV
Horácio Peixeiro e Catarina Barreira
Em breve síntese, apontar-se-ão algumas características da produção nacional, tendo em conta outras intervenções sobre a mesma temática:
• Tal como no século anterior, a iluminura do séc. XV anda associada, por via de regra, às iniciais, sendo sobretudo funcional, elemento de marcação do texto e de estruturação do códice, e singela como o monstra a dominância das inicias coloridas e a filigrana.
• É notória a crescente importância da produção laica, ligada à corte, onde o cultivo das letras e a constituição de livrarias mostra um apreço do livro que, no tempo de D. Manuel, atinge o ponto mais alto.
• Assinala-se a novidade da produção de livros para a liturgia em conventos femininos, destacando-se o convento dominicano de Jesus de Aveiro. Em Lorvão e Arouca continua a prática da encomenda.
• Apesar da modéstia do ornato, é de assinalar um excepcional grupo de códices, cujo ar de família pode ver-se na utilização de ramagens com motivos e cores semelhantes, referenciados em Alcobaça, na Corte de Avis e no círculo do condestável D. Pedro, sendo a Crónica Geral de Espanha, da Academia das Ciências e Lisboa, o exemplo maior.
• Novidade é também a paleta utilizada, com uma maior gama de cores e tons, e uma técnica de sobreposição de camadas semelhante à pintura, e ainda a utilização da cor violeta para o regramento e a filigrana, talvez aquela referida como catassol em O livro de como se fazem as cores todas para aluminar os livros, tratado escrito em meio judaico, que a iluminura judaica coeva emprega de modo idêntico.
• Neste âmbito, o missal Alc. 459 é um excelente exemplo da abertura do scriptorium de Alcobaça ao fenómeno do nomadismo artístico. Este processo de adaptação e integração formal e temática teve um importante impacto na renovação da decoração iluminada dos seus manuscritos ao longo do século XV, mas em particular no missal referido. Dois dos seus fólios exibem cercaduras vegetais que atestam a circulação de modelos ligados aos livros de horas e que também vão influenciar a Escola de Lisboa.
Sobre os autores:
Horácio Augusto Peixeiro
Mestre em História da Arte pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UNL (1987) com uma tese sobre Missais iluminados dos séculos XIV-XV: contribuição para o estudo da iluminura em Portugal. Professor Coordenador Aposentado do Instituto Politécnico de Tomar.
Catarina Fernandes Barreira
Doutorada em Ciências da Arte pela Universidade de Lisboa é desde 2011 Investigadora Integrada do Instituto de Estudos Medievais (IEM) e Profª Adjunta Convidada a tempo parcial no Inst. Politécnico de Leiria. O seu campo de investigação actual desenrola-se em torno do papel desempenhado pelos fenómenos do nomadismo artístico e da identidade alcobacense na produção de códices iluminados no scriptorium de Alcobaça nos séculos XIV e XV no âmbito de um projecto de estudos de Pós-Doutoramento apoiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.
7 – A produção de incunábulos hebraicos em Portugal nos finais do século XV
João Castela Oliveira
Um dos contributos mais significativos e marcantes da comunidade judaica residente em Portugal nos finais do século XV para o meio artístico-cultural português da época, foi a instalação das primeiras oficinas tipográficas e a produção dos primeiros livros impressos. Terá sido graças a esta comunidade que a imprensa chegou a Portugal, pois o primeiro incunábulo a ser produzido em território português foi o Pentateuco de Faro, impresso em 1487 na mesma cidade, embora esteja escrito em hebraico e não em português. Esta obra foi produzida na oficina do nobre judeu Dom Samuel Gacon, que a terá patrocinado. Para além de Faro, existiram outras importantes oficinas tipográficas hebraicas em Lisboa e Leiria, pertencentes a Elieser Toledano e à família d’Ortas, respetivamente. O objetivo principal deste estudo consiste em analisar de um modo geral estas oficinas pertencentes a judeus e a sua produção.
Uma vez que o estudo se insere no âmbito do projeto intitulado “Iluminura Hebraica em Portugal durante o Século XV”, patrocinado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), pretende-se também compreender e aferir acerca das possíveis relações entre os manuscritos iluminados hebraicos e a produção dos primeiros livros impressos nas três oficinas hebraicas portuguesas que se conhecem, de modo a perceber se existiu uma continuidade, ou se, pelo contrário, houve uma quebra entre os dois tipos de produção.
Sobre o autor:
Licenciado em História. Mestrando em História Medieval pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, é atualmente bolseiro de investigação do projeto intitulado “Iluminura Hebraica em Portugal durante o Século XV”, com a referência PTDC/EAT – HAT/119488/2010, numa parceria entre a Cátedra de Estudos Sefarditas «Alberto Benveniste» e o Instituto de História da Arte, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).
8 – Iluminura hebraica: contextos bíblico-bibliográficos medievais
José Augusto M. Ramos
Na era pós-helenística e pós-targúmica: o judaísmo rabínico fixa-se directamente no texto hebraico. À diferença do cristianismo, investe menos noutras línguas (cf. árabe). É uma concentração de identidade, sem excluir intercâmbios culturais de espaço aberto.
1. Fórmulas e etapas de canonicidade (equivalem a três patamares de canonicidade):
– Torá: a protobíblia (cf. Samaritanos e Saduceus)
– Nevi’im (Profetas e Históricos)
– Ketuvim (Escritos /Sapienciais) Ordem: Sl; Pr; Jb / Ct; Rt; Lm; Coh; Est; / Dn; Esd; Cr.
2. Decorrências directas do cânone bíblico:
– Torá: Parashah + Haftarot (Leccionário).
– Megillot (Leccionários específicos): Ct (Páscoa), Rt (Pentecostes), Lm (9 de Av), Coh (Ecl)
(Sukkot) Est (Purim), com reordenamento do cânone em era pós-talmúdica, em base litúrgica.
Lidos em impresso ou, ainda hoje, em manuscrito sobre pergaminho (Est).
– Bíblia rabínica (cf. Bíblia poliglota): já na era da imprensa. À imagem do Talmud.
3. Cânones de circunstância:
– Seg