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NOVIDADE: Resumos das comunicações a apresentar no Colóquio "Relações Culturais Judaico-Cristãs em Portugal no Final da Idade Média"

31 de outubro e 1 de novembro de 2013, no anfiteatro III da FLUL

RESUMOS DAS COMUNICAÇÕES A APRESENTAR NO COLÓQUIO:

1 - Manuscritos internacionais quatrocentistas em Portugal

Adelaide Miranda / Luís Ribeiro

A construção de um panorama dos manuscritos internacionais que circulavam no Portugal quatrocentista coloca-nos um grande desafio. No estado actual do conhecimentos é difícil avaliar até que ponto os códices iluminados conservados em Portugal estiveram presentes nas bibliotecas ou foram adquiridos por coleccionadores mais tardios (como por exemplo Frei Manuel do Cenáculo e D. Francisco de Melo Manuel). A ausência de monografias sobre os manuscritos e sua circulação dificulta um estudo rigoroso deste tema. Nesta comunicação procuramos estabelecer as tipologias dominantes e as imagens que lhes estão associadas de forma a criar um primeiro esboço do que pensamos ser os manuscritos iluminados que corresponderiam ao gosto das elites portuguesas dessa época.

Sobre os autores:
Maria Adelaide Miranda
Licenciada em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Mestre e Doutorada pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Actualmente é Professora Associada Aposentada. As suas áreas de investigação centram-se na Arte Medieval, nomeadamente nos domínios da cor, iconografia e iluminura. Neste âmbito tem participado em projectos de Investigação interdisciplinares: A cor na Iluminura Medieval e Imago, que pretendem aprofundar e divulgar estes domínios artísticos. É membro da direcção do Instituto de Estudos Medievais e colabora no Instituto de História da Arte, pertencendo ao conselho redactorial das revistas Medievalista on line (IEM) e De Arte (Univ. de León).

Luís Campos Ribeiro
Investigador do Instituto de Estudos Medievais, FCSH-UNL e licenciado em História da Arte pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Actualmente é bolseiro do projecto “Iluminura hebraica em Portugal durante o século XV” e está a preparar um doutoramento em História da Arte sobre iluminura nos livros de ciência medievais.



2 - Ler e contemplar

Aires A. Nascimento

Ler e contemplar… Serão duas operações diferentes? Ou complementares? Na tradição, aparecem confinadas a tempos e locais diferenciados, como diferenciado é o lugar para escrever e o que é destinado à leitura. Parecendo que se banalizou o acesso à leitura, pois até nos lugares mais comuns ela aparece, importará perguntar se a indiferença com que passamos pelos outros é sinal de recolhimento para recolher o que eventualmente ficou do texto que não queremos largar ou se esse refúgio não é mais que um pretexto para distracção mais longínqua e alheada. Distinguir para congraçar, juízo para compreender, na superação de entraves e no reconhecimento de instrumentalidade dos suportes de texto…, enfim, para reinventar a leitura e reanimar um diálogo alargado e construtivo, em que o silêncio não é ausência, mas estudar é esforço e ler é acto prolongado de recolha e reconfiguração interior pela admiração do outro que se nos oferece através do texto da sua autenticidade e apresenta a possibilidade de nos re-inventarmos a nós próprios na identidade que sente o sentido da comunhão: a contemplação é admiração e reconfiguração activa, leitura é operação dinâmica que a escola deve preparar.

Sobre o autor:
Ensinou várias disciplinas na Faculdade de Letras de Lisboa: de formação clássica e filológica de base, integrou projectos vários destinados a recolher textos e estudá-los na dinâmica da sua inserção em comunidades textuais e perceber eventuais derivas causadas; entre outras disciplinas, ensinou Codicologia em diversos cursos de Mestrado e Pós-graduação em várias universidades portuguesas, cabendo-lhe a introdução dessa disciplina entre nós, marcando o seu ensino pelo estudo da funcionalidade do livro como instrumento do texto e recuperação das marcas que revelam a sua orientação para a leitura integrada em comunidades culturais. A sua bibliografia nesse domínio pode ver-se em diversos estudos publicados desde 1978, como vem indicado em currículo divulgado em Ler contra o Tempo, Lisboa, Centro de Estudos Clássicos, 2013. O autor faz parte da Academia das Ciências de Lisboa, secção de Filologia, onde tem o lugar nº 17, em que sucedeu a Américo da Costa Ramalho.



3 - Burlas Hebraicas e verdades latinas. Álvaro de Brito Pestana e as Lamentações de Jeremias

Ana Maria Sánchez Tarrío (anatarrio@campus.ul.pt)

O antijudaismo das trovas a Luís Fogaça de Álvaro de Brito Pestana (c. 1481) singulariza-se pela denúncia do perigoso ascendente dos rabinos contemporâneos sobre os cristãos mais ‘doutrinados’ do seu tempo, em particular Isaac Abravanel, nos anos iminentes à conversão forçada e à expulsão. A espinha dorsal da composição é uma alegoria da cidade de Lisboa, degradada pela peste física e moral, prefigurada na Jerusalém das Lamentationes do profeta Jeremias. O texto encontra elucidativo contraponto na utilização das profecias de Jeremias por parte do próprio Abravanel como prefiguração da expulsão dos judeus da Península Ibérica. As trovas delatam a partilha entre o saber cristão e judaico na Lisboa da viragem para o reinado de D. João II, focando a comunidade de cristãos hebraístas ou doutrinados pelos judeus, e lançando interrogantes sobre os possíveis materiais de mediação (traduções latinas ou vernáculas do hebraico).

Sobre a autora:
Professora Associada com Agregação do Departamento de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É autora do livro Paisagem e erudição no humanismo português (Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2009), e de outros estudos sobre o Cancioneiro Geral de Garcia de Resende e o papel do humanismo latino e da tradição clássica na cultura portuguesa quinhentista, particularmente nas obras de João Rodrigues de Sá de Meneses, Duarte de Resende, Martim de Figueiredo, Dr. João de Barros, Fernando Oliveira.



4 - As tábuas astronómicas de Abraão Zacuto e as navegações oceânicas

António Costa Canas (costacanas@gmail.com)

Neste texto falaremos sobre os contributos de Abraão Zacuto para o desenvolvimento da navegação astronómica em Portugal. Começaremos por apresentar, de uma forma bastante sucinta, a evolução da náutica portuguesa, em finais do século, de modo a compreendermos a necessidade de desenvolvimento de novas técnicas de navegação. Esta nova prática de navegar implicou a colaboração de astrónomos, tendo sido fundamental a contribuição de vários astrónomos de origem hebraica, nomeadamente Abraão Zacuto e José Vizinho.
A nossa explicação procurará identificar os diferentes problemas que foram sendo detetados, na transição de uma náutica de origem mediterrânica, suficiente para percursos relativamente curtos, para uma náutica oceânica, na qual os navios passavam longos períodos sem avistar terra. Após a identificação de cada problema explicaremos a solução para ultrapassar o mesmo.
Após identificação dos problemas fundamentais que foram sendo ultrapassados, passaremos a expor o contributo de alguns dos astrónomos que contribuíram para a evolução da arte de navegar. A nossa atenção centrar-se-á em Zacuto, apresentando uma breve biografia do mesmo, seguida dos seus contributos.

Sobre o autor:
Oficial da Marinha, sendo atualmente diretor do Museu de Marinha. Concluiu o doutoramento em especialidade de Descobrimentos e da Expansão Portuguesa, pela Universidade de Lisboa. Membro do Centro Interuniversitário de História das Ciências e da Tecnologia, do Centro de Investigação Naval e da Direção do Seminário Nacional de História da Matemática. Secretário do International Committee for the History of Nautical Science. Integra a Comissão Científica responsável pela edição das Obras de Pedro Nunes, no âmbito da Academia das Ciências. Cerca de três dezenas de textos publicados entre livros, capítulos de livros e artigos em revistas, atas de congressos e colóquios. Principais áreas de interesse: história marítima e história da ciência.



5 - ‘SephardiPal’: entre as letras e formas dos manuscritos sefarditas tardo-medievais

Débora Matos


Considerando a história recente do livro hebraico, observa-se um interesse crescente pela aplicação de novas tecnologias ao seu estudo, designadamente em termos de paleografia, não só por parte de investigadores tradicionalmente da área das humanidades, como também da área da computação. O diálogo metodológico tem aberto portas para novas possibilidades de investigação que, no entanto, não obliteram o papel do historiador/paleógrafo. Atualmente a ser desenvolvida na King’s College London, ‘SephardiPal’ é uma ferramenta e base de dados que permite a anotação, descrição e comparação de imagens, a análise morfológica de caracteres e elementos decorativos em detalhe e que possibilita o cotejo de grandes quantidades de informação. Partindo de dois casos concretos, os manuscritos da ‘Escola da Andaluzia’ e da ‘Escola de Lisboa’, proponho-me descrever os desafios atuais da minha investigação sobre a mobilidade de escribas judeus na Península Ibérica na segunda metade do século XV, e como ‘SephardiPal’ tem sido determinante no processo de obtenção de dados.

Sobre a autora
Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (2003). Mestre em Arte, Património e Teoria do Restauro pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (2011), com a tese The Ms Parma 1959 in the context of Portuguese Hebrew illumination. Doutoranda no King’s College, onde desenvolve uma dissertação dedicada ao tema Hebrew book production in Portugal: influences and offshoots.



6 - A iluminura portuguesa no século XV

Horácio Peixeiro e Catarina Barreira

Em breve síntese, apontar-se-ão algumas características da produção nacional, tendo em conta outras intervenções sobre a mesma temática:
• Tal como no século anterior, a iluminura do séc. XV anda associada, por via de regra, às iniciais, sendo sobretudo funcional, elemento de marcação do texto e de estruturação do códice, e singela como o monstra a dominância das inicias coloridas e a filigrana.
• É notória a crescente importância da produção laica, ligada à corte, onde o cultivo das letras e a constituição de livrarias mostra um apreço do livro que, no tempo de D. Manuel, atinge o ponto mais alto.
• Assinala-se a novidade da produção de livros para a liturgia em conventos femininos, destacando-se o convento dominicano de Jesus de Aveiro. Em Lorvão e Arouca continua a prática da encomenda.
• Apesar da modéstia do ornato, é de assinalar um excepcional grupo de códices, cujo ar de família pode ver-se na utilização de ramagens com motivos e cores semelhantes, referenciados em Alcobaça, na Corte de Avis e no círculo do condestável D. Pedro, sendo a Crónica Geral de Espanha, da Academia das Ciências e Lisboa, o exemplo maior.
• Novidade é também a paleta utilizada, com uma maior gama de cores e tons, e uma técnica de sobreposição de camadas semelhante à pintura, e ainda a utilização da cor violeta para o regramento e a filigrana, talvez aquela referida como catassol em O livro de como se fazem as cores todas para aluminar os livros, tratado escrito em meio judaico, que a iluminura judaica coeva emprega de modo idêntico.
• Neste âmbito, o missal Alc. 459 é um excelente exemplo da abertura do scriptorium de Alcobaça ao fenómeno do nomadismo artístico. Este processo de adaptação e integração formal e temática teve um importante impacto na renovação da decoração iluminada dos seus manuscritos ao longo do século XV, mas em particular no missal referido. Dois dos seus fólios exibem cercaduras vegetais que atestam a circulação de modelos ligados aos livros de horas e que também vão influenciar a Escola de Lisboa.

Sobre os autores:
Horácio Augusto Peixeiro
Mestre em História da Arte pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UNL (1987) com uma tese sobre Missais iluminados dos séculos XIV-XV: contribuição para o estudo da iluminura em Portugal. Professor Coordenador Aposentado do Instituto Politécnico de Tomar.

Catarina Fernandes Barreira
Doutorada em Ciências da Arte pela Universidade de Lisboa é desde 2011 Investigadora Integrada do Instituto de Estudos Medievais (IEM) e Profª Adjunta Convidada a tempo parcial no Inst. Politécnico de Leiria. O seu campo de investigação actual desenrola-se em torno do papel desempenhado pelos fenómenos do nomadismo artístico e da identidade alcobacense na produção de códices iluminados no scriptorium de Alcobaça nos séculos XIV e XV no âmbito de um projecto de estudos de Pós-Doutoramento apoiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.



7 - A produção de incunábulos hebraicos em Portugal nos finais do século XV

João Castela Oliveira

Um dos contributos mais significativos e marcantes da comunidade judaica residente em Portugal nos finais do século XV para o meio artístico-cultural português da época, foi a instalação das primeiras oficinas tipográficas e a produção dos primeiros livros impressos. Terá sido graças a esta comunidade que a imprensa chegou a Portugal, pois o primeiro incunábulo a ser produzido em território português foi o Pentateuco de Faro, impresso em 1487 na mesma cidade, embora esteja escrito em hebraico e não em português. Esta obra foi produzida na oficina do nobre judeu Dom Samuel Gacon, que a terá patrocinado. Para além de Faro, existiram outras importantes oficinas tipográficas hebraicas em Lisboa e Leiria, pertencentes a Elieser Toledano e à família d’Ortas, respetivamente. O objetivo principal deste estudo consiste em analisar de um modo geral estas oficinas pertencentes a judeus e a sua produção.
Uma vez que o estudo se insere no âmbito do projeto intitulado "Iluminura Hebraica em Portugal durante o Século XV", patrocinado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), pretende-se também compreender e aferir acerca das possíveis relações entre os manuscritos iluminados hebraicos e a produção dos primeiros livros impressos nas três oficinas hebraicas portuguesas que se conhecem, de modo a perceber se existiu uma continuidade, ou se, pelo contrário, houve uma quebra entre os dois tipos de produção.

Sobre o autor:
Licenciado em História. Mestrando em História Medieval pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, é atualmente bolseiro de investigação do projeto intitulado "Iluminura Hebraica em Portugal durante o Século XV", com a referência PTDC/EAT – HAT/119488/2010, numa parceria entre a Cátedra de Estudos Sefarditas «Alberto Benveniste» e o Instituto de História da Arte, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).



8 - Iluminura hebraica: contextos bíblico-bibliográficos medievais

José Augusto M. Ramos

Na era pós-helenística e pós-targúmica: o judaísmo rabínico fixa-se directamente no texto hebraico. À diferença do cristianismo, investe menos noutras línguas (cf. árabe). É uma concentração de identidade, sem excluir intercâmbios culturais de espaço aberto.

1. Fórmulas e etapas de canonicidade (equivalem a três patamares de canonicidade):
- Torá: a protobíblia (cf. Samaritanos e Saduceus)
- Nevi’im (Profetas e Históricos)
- Ketuvim (Escritos /Sapienciais) Ordem: Sl; Pr; Jb / Ct; Rt; Lm; Coh; Est; / Dn; Esd; Cr.
2. Decorrências directas do cânone bíblico:
- Torá: Parashah + Haftarot (Leccionário).
- Megillot (Leccionários específicos): Ct (Páscoa), Rt (Pentecostes), Lm (9 de Av), Coh (Ecl)
(Sukkot) Est (Purim), com reordenamento do cânone em era pós-talmúdica, em base litúrgica.
Lidos em impresso ou, ainda hoje, em manuscrito sobre pergaminho (Est).
- Bíblia rabínica (cf. Bíblia poliglota): já na era da imprensa. À imagem do Talmud.
3. Cânones de circunstância:
- Segundo funcionalidades específicas, como no cristianismo. Por ex.: Evangelhos e Salmos.
- Selecções bíblicas variáveis.
4. Recomposições bíblico-litúrgicas:
- Fenómeno medieval e de paralelismo judaico-cristão.
- Séder (“Ordo”); siddur ( ordinário litúrgico semanal); maħzor (ciclo anual das festas); ‘avodah (serviço): para uso na sinagoga ou em casa (textos bíblicos, salmos, etc…)
- Outros devocionários;
- Haggadah (recitação pascal): rico e personalizado: decorações (texto, comentários e traduções).
- Originalidades do mundo judaico sefardita (edições litúrgicas; piyyuţim).
5. Complementos pedagógicos do texto, com espaço para tratamento decorativo:
- Massorah qetanah; massorah gedolah; massorah final (somatórios); listagens massoréticas: a massorah de Ben Hayyim (Bomberg-1525, mss. espanh.).
6. Textos directores além da Bíblia:
- Mishnah (tannaim = docentes) + gemarah (amoraim = explicadores) ---» TALMUD (estudo): instrumentos de estudo para elites liderantes.
- Literatura de halakhah: Mishneh Torah; Taqqanot; Teshuvot; Halakhot Gedolot; Shluhan ’arukh.
7. Instrumentos destacados:
- Comentários, que estão na origem da Bíblia rabínica (Miqra’ot Gedolot: com haggadah e midrash)
- Gramáticas do tratamento massorético: Sefer Mikhlol (gramática), extensão dos Diqduq haţţe´amim (gramática de “entoações”); ou Diqduq hamassorah (tradição); Diqduq haniqud (pontuação).

Sobre o autor:
Professor Catedrático Emérito da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Licenciatura em Teologia (Instituto Católico- Toulouse - 1969); Diplomas de Hebraico e de Aramaico (Instituto Católico de Toulouse - 1969); Licenciatura em Ciências Bíblicas e Orientais (Instituto Bíblico de Roma- 1972); Doutoramento em História Antiga (Universidade de Lisboa- 1989); Agregação em História (UL – 1996). Estudos e traduções: O sufixo verbal não acusativo em hebraico antigo, no contexto semítico do noroeste (Dissertação de doutoramento, Universidade de Lisboa, 1989); Evangelho segundo Tomé (Editorial Estampa, Lisboa, 1992); Bíblia Sagrada (Difusora Bíblica, Lisboa/Fátima, 2008); A Bíblia para todos (Sociedade Bíblica, Lisboa, 2009 [edição revista em equipa da tradução de 1993]); From Antiquity to the Present: the 2008 European Association of Biblical Studies Lisbon Meeting (com P. Davies e M. T. Valdez (eds.), CHUL, Lisboa, 2008).



9 - A “Escola de Lisboa” no contexto dos manuscritos sefarditas tardo-medievais

Luís Urbano Afonso (luis.afonso@fl.ul.pt)

Os manuscritos hebraicos pertencentes ao núcleo central da “Escola de Lisboa”, formado por oito códices, autonomizam-se facilmente dos manuscritos produzidos noutros centros sefarditas tardo-medievais. Com uma atividade documentada, tradicionalmente, entre 1471 e 1497, a chamada “Escola de Lisboa”, ou “Atelier de Lisboa”, segundo a proposta de Sed-Rajna (1970), carateriza-se pela combinação de três opções artísticas: 1ª) o recurso a um tipo de cercadura fito-zoomórfica, ricamente colorida, realizada numa linguagem tardo-gótica, repetida sem variações significativas na maior parte dos manuscritos deste grupo; 2ª) o recurso a filigranas desenhadas em cor púrpura combinadas com filetes e/ou letras pintadas a ouro; 3ª) o recurso a formas geométricas muito simples na micrografia da massorah.
No mesmo período existiram outros centros de produção sefardita igualmente coerentes: um que se supõe estar situado em Toledo, segundo proposta de Andreina Contessa (2009, 2012); outro localizado na Andaluzia, especificamente em Córdova e Sevilha, segundo proposta de L. Afonso, T. Moita e D. Matos (no prelo). Os manuscritos do primeiro grupo recorrem a formas geométricas mais diversificadas e complexas na micrografia da massorah, combinadas com iluminação de tipo tardo-gótico, ainda que diferente da que encontramos na “Escola de Lisboa”, e ainda, como aqui se irá propor, com uma aproximação muito relevante à arte da tipografia. Os do segundo grupo, por sua vez, apresentam-se profundamente embebidos na tradição islâmica, ou mudéjar, no que toca aos padrões decorativos, além de serem, maioritariamente, monocromáticos. Os restantes manuscritos iluminados sefarditas do final do século XV não permitem a sua agregação em torno de núcleos suficientemente diferenciados e idiossincráticos, dada a enorme variedade de soluções encontrada e dado o relativo isolamento formal de cada um. Ainda assim, B. Narkiss (1982) propôs a designação de grupo “hispano-português” para um número significativo destes manuscritos, proposta que também será revista criticamente nesta exposição.
Na sequência da caraterização estilística dos quatro grupos referidos, procura-se compreender, abreviadamente, o significado cultural e político das soluções artísticas encontradas em cada um deles.

Sobre o autor:
Investigador do Instituto de História da Arte da FLUL. Concluiu o doutoramento em História da Arte pela Universidade de Lisboa em 2006, onde é Professor Auxiliar. Publicou 29 artigos em revistas especializadas, 19 capítulos de livros e 6 livros (3 como autor, 3 como coordenador). Orientou 17 dissertações de mestrado nas áreas de História da Arte e Gestão de Mercados da Arte. Coordena o projeto de investigação: “Iluminura hebraica em Portugal durante o século XV” (referência PTDC/EAT-HAT/119488/2010). Currículo completo na plataforma DeGóis (http://www.degois.pt).



10 - Os Judeus e a Cultura de Corte em Portugal (séculos XIV e XV)

por Manuela Santos Silva
F.L.- Universidade de Lisboa
C.H.F.L.U.L./I.E.M.

Interessada, desde há alguns anos, na temática da composição e do funcionamento da corte régia e das suas casas, seduziu-me a participação no colóquio “Relações culturais judaico-cristãs em Portugal no final da Idade Média”, uma vez que me pareceu uma boa oportunidade para explorar a participação judaica não só no órgão governativo “central” do reino, mas também a sua presença, e eventual influência, no dia-a-dia cortesão. A busca de dados iniciar-se-ia pelas crónicas régias, ao mesmo tempo que se procederia ao levantamento das chancelarias dos reis de Portugal da época, recorrendo ainda a todo o tipo de textos relacionados com a corte régia e os seus membros e/ou que espelhassem a mentalidade partilhada pela família régia e sua “entourage” no que respeitava aos judeus ou pelo menos àqueles com quem tinham oportunidade de conviver.
Os resultados de tal levantamento revelaram-se parcimoniosos, embora fornecendo indicadores importantes. Preferimos, ainda assim, encarar esta comunicação como a apresentação de um projeto que continuaremos a desenvolver. Para já fica-nos a possibilidade de vos apresentar um programa em torno dos seguintes pontos:
- a relação dos reis cristãos peninsulares com os judeus (e mouros) moradores no “seu senhorio”;
- a escolha de indivíduos de etnia judaica para o desempenho de cargos da confiança do rei;
- a desconfiança entre os membros da corte (e a sociedade) relativamente aos judeus;
- a legislação segregacionista;
Terminando finalmente no assunto que pretendemos incrementar:
- a presença de judeus na corte régia portuguesa e a sua integração na estrutura cortesã.

Sobre a autora:

Manuela Santos Silva é Licenciada em História e Mestre em História Medieval pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e Doutora em História Medieval pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa onde leciona no Departamento de História unidades curriculares do 1º, 2º e 3º Ciclos (Licenciatura, Mestrado e Doutoramento). Parte da sua investigação tem sido dedicada ao estudo do território medieval de Portugal, tanto nos aspetos espaciais como do ponto de vista administrativo, e nos últimos anos tem investigado aspetos da monarquia medieval, nomeadamente no que diz respeito ao seu caráter familiar, dedicando atenção sobretudo ao papel das rainhas-consortes. Com duas outras colegas dirigiu e coordenou a coleção “Rainhas de Portugal” publicada pelo Círculo de Leitores e Temas e Debates e é autora da biografia de “A Rainha Inglesa de Portugal: Filipa de Lencastre”.



11 - Judeus, conversos e tornadiços na esfera do poder régio

Margarida Garcez Ventura

A política dos reis da cristandade no que concerne aos judeus está fortemente relacionada com a concepção que se foi construindo sobre o seu “ofício”.
Sabemos quão precoce é, na monarquia portuguesa, a tendência para a autonomização das coisas temporais em relação às espirituais, numa delimitação de territórios acompanhada pelo alargamento das jurisdições régias sobre as jurisdições da clerezia. Ora, tendo em conta que o fundamento das problemáticas nas relações entre judeus e cristãos é de ordem religiosa (o judeus são considerados culpados da morte de Cristo) a regulamentação dessas relações situa-se na fronteira entre a jurisdição temporal e espiritual. Ora, com especial incidência nos reinados de D. João I / D. Duarte muitas das questões relativas aos judeus são veementemente reclamadas para a estrita jurisdição régia, subtraídas, portanto, à jurisdição do clero.
Em paralelo com elementos legislativos vertidos nas Ordenações teremos de considerar textos a que poderemos chamar para-normativos produzidos, quer no âmbito do Desembargo régio quer em reuniões sinodais, e abordam a questão dos conversos, dos falsos conversos e dos “tornadiços”. Nessas fontes se incluem leis, queixas da clerezia e textos concordatários. Na verdade, esses textos resultam claramente de situações particulares, de uma casuística que se desenvolve no quotidiano dos diversificados encontros entre cristãos, judeus, conversos e falsos conversos. Assim, as queixas, os debates e a legislação produzida sobre os as três categorias acima mencionadas são bons meios de diagnóstico para compreender o “programa político” da monarquia portuguesa a respeito dos judeus.

Sobre a autora:
Professora Auxiliar de Nomeação Definitiva, com Agregação, da Faculdade de Letras de Lisboa. Trabalha preferencialmente nas áreas da História Institucional e Política, das Mentalidades Políticas e da História da Igreja. Académica de Número da Academia Portuguesa da História. Membro Efectivo da Classe de História Marítima da Academia da Marinha. Membro do Centro de História da Faculdade de Letras de Lisboa (desde 1972). Membro fundador da Sociedade Portuguesa de Estudos Medievais. Membro da Sociedade Científica da Universidade Católica Portuguesa. Membro Fundador do Instituto de Cultura Europeia e Atlântica (Ericeira) do qual é Vice-Presidente para a Área Científica e Educacional. Pertence ao grupo fundador (2005), dos Encontros Luso-Brasileiros de História Medieval “Raízes Medievais do Brasil Moderno”.



12 - Heráldica em manuscritos iluminados hebraicos portugueses: uma primeira caracterização

Miguel Metelo de Seixas

A relação entre historiadores e heraldistas tem sido, até ao presente, pautada por alguma desconfiança mútua, radicada numa ideia limitativa: a da associação inerente da heráldica à nobreza; e, consequentemente, a dos estudos heráldicos aos genealógicos e nobiliárquicos. Mas o fenómeno heráldico foi (e continua a ser) muito mais abrangente e socialmente difundido do que os tratados de armaria e as normativas régias quiseram, a partir de final da Idade Média, fazer crer. A análise da heráldica presente em manuscritos hebraicos de origem portuguesa quatrocentista permitiu, nesse sentido, trazer à tona uma série de escudos de armas que mantêm estreita relação com a cultura judaica coeva. Tais emblemas heráldicos poderão ter valor meramente decorativo, decorrendo da reprodução de modelos formais então na moda; não é porém de excluir que tenham também um valor identificativo e eventualmente simbólico, apresentando-se portanto como forma de auto-representação – e de comunicação – da comunidade judaica portuguesa na derradeira fase da sua existência medieval. O estudo deste património heráldico pode pois contribuir para um melhor conhecimento do que foi esta mesma comunidade e, em simultâneo, do que foi a heráldica portuguesa tardo-medieval.

Sobre o autor:
Doutor em História pela Universidade Lusíada de Lisboa, onde exerce o cargo de professor auxiliar e dirige desde 1998 o Centro Lusíada de Estudos Genealógicos e Heráldicos. É desde 2011 bolseiro de pós-doutoramento FCT, como investigador integrado do Instituto de Estudos Medievais e do Centro de História de Além-Mar, ambos da Universidade Nova de Lisboa, com um projecto sobre “A heráldica portuguesa (séculos XV - XVIII): um código de representação social e política”, acolhido também na École des Hautes Études en Sciences Sociales (Paris). Na área da heráldica e da história, tem publicado, desde 1994, numerosos livros, obras colectivas, capítulos de livros e artigos, com destaque para Estudos de Heráldica Medieval (coordenação, em conjunto com Maria de Lurdes Rosa, 2012) e Heráldica, representação do poder e memória da nação (2011); editou recentemente o armorial seiscentista Compendio das Armas dos Reynos de Portugal & Algarve & das Cidades e Villas principaes delles, de Cristóvão Alão de Morais (2013). É académico da Académie Internationale d’Héraldique, sócio de número e presidente do Instituto Português de Heráldica, membro do conselho redactorial de Anais de História de Além-Mar e director da revista Armas e Troféus.



13 - As iluminuras do Mosteiro de Jesus de Aveiro e as suas eventuais relações com a iluminura hebraica tardo-medieval

Paula Cardoso

O estudo da produção do scriptorium feminino das dominicanas do Mosteiro de Jesus de Aveiro procurou, antes de mais, contribuir para o preenchimento da lacuna no estudo da iluminura monástica produzida em Portugal no final do século XV. Através do estudo dos códices legados por Maria de Ataíde e Isabel Luís, freiras do dito mosteiro, procurou traçar-se o perfil da iluminura produzida no scriptorium aveirense. Concluiu-se que esta está, regra geral, de acordo com o panorama da iluminura portuguesa do final do século XV, mostrando um cruzamento de linguagens de que as pontuais semelhanças com a iluminura hebraica são exemplo. Salientam-se, no entanto, as suas características singulares relacionadas com o carácter intimista que a decoração de livros sagrados pode adquirir quando é feita pela própria comunidade, construtora da sua própria cultura visual, onde o propósito devocional se sobrepõe, por vezes, à experiência e ao cânone artístico.


Sobre a autora:
Licenciada em Estudos Artísticos pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (2011). Terminou, recentemente, a dissertação intitulada “A iluminura de Isabel Luís e Maria de Ataíde no Mosteiro de Jesus de Aveiro (c.1465 -1500)” no âmbito do mestrado em Arte, Património e Teoria do Restauro da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Actualmente é doutoranda em História da Arte Medieval na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.



14 - Between Images, Texts and Jewish Life: The Cultural Geography of Hebrew Illuminated Manuscripts

Shalom Sabar (shsabar@gmail.com)

Any discussion of Jewish art must take into account the place of the image in Judaism. This topic accompanies the history of Jewish art from ancient times till present day Israel. We will examine how this concept was formulated and how it influenced eventually the art of Hebrew manuscript illumination in the Middle Ages. Surprisingly enough, in Late Antiquity ("Talmudic period") the rabbis demonstrated a more or less lenient approach towards the place of the image in Jewish life - especially if it was not associated with idolatry (which was dying out in the early Christian period). Synagogues (most well known is that of Dura Europos) were illustrated with biblical and other scenes that were not tolerated in later periods. In the Middle Ages this approach dramatically changed and was determined by various religious factors, as well as socio-cultural considerations, reflecting the status of Judaism as a religious minority active within host societies - whether in the Islamic East or Christian Europe. As the visual arts never gained a central place in Jewish culture, the arts and crafts which were created by or for them have been largely dependent on the norms and aesthetics of the surrounding culture, mixed with Jewish concepts, ideals and subject matter. In the lands of Islam figurative imagery was not usually tolerated, and medieval Hebrew manuscripts from Egypt or Yemen for example, show decorative patterns, carpet pages, and delicate micrographic designs. In Germany (Ashkenaz), the human figure was frowned upon and the artists had to "invent" curious solutions to overcome this issue. In Spain (Sephard) the rabbis were much more open to cultural influences and the book arts were even encouraged by some - definitely reflecting the intellectual and elevated status of the Jewish communities in the leading Jewish centers, such as Barcelona and Toledo. Fifteenth century Hebrew manuscript illumination reached its height in Italy, and under the influence of the Renaissance some of the most elaborate Hebrew codices were illuminated in centers such as Rome, Florence, Mantua, Pesaro, Ferrara and Venice.

About the author:
Ph.D. (1987) University of California Los Angeles in Art History, is professor of Jewish Art and Folklore at the Hebrew University of Jerusalem. His research and publications concentrate on the history of Jewish art from Biblical times to the present, investigating in particular folk art, material culture, and ceremonies and customs of Jewish communities, and their relationships with the folk and visual cultures of the host societies in Christian Europe and the Islamic East. Published nearly 200 essays and reviews on various aspects related to these topics. Among his books: Ketubbah: Jewish Marriage Contracts of the Hebrew Union College Skirball Museum and Klau Library (Philadelphia and New York, 1990); Mazal Tov: Illuminated Jewish Marriage Contracts from the Israel Museum Collection (Jerusalem: The Israel Museum, 1994); Jerusalem - Stone and Spirit: 3000 Years of History and Art (with Dan Bahat; Tel Aviv, 1997); The Life Cycle of the Jews in Islamic Lands (Jerusalem, 2006).



15 - A iluminura italiana e as cercaduras acânticas dos manuscritos hebraicos portugueses

Tiago Moita

Os manuscritos hebraicos produzidos em Lisboa na segunda metade do século XV apresentam uma estabilidade no seu reportório ornamental e nas suas composições que atestam o funcionamento de uma escola de cópia e de iluminura nesta cidade. Entre estas composições destacam-se, pela sua exuberância e originalidade, as cercaduras preenchidas com folhagens acânticas e motivos zoomórficos, com um uso intenso e variado da cor, as quais podem ser justamente consideradas como a principal tipologia decorativa deste conjunto português. Neste sentido, com a presente comunicação, pretende-se, antes de mais, localizar, descrever e analisar as cercaduras acânticas referidas, para, num segundo e mais demorado momento, problematizarmos em torno dos possíveis modelos que, eventualmente, lhes possam subjazer. Para esse efeito, chamamos à liça manuscritos hebraicos e cristãos italianos, provenientes, sobretudo os últimos, da região da Campânia, com os quais podemos apreciar certo grau de afinidade. Esta situação reforça a dependência da iluminura hebraica portuguesa da produção italiana, mas coloca novas dificuldades ao apontar manuscritos cristãos (e não exclusivamente códices hebraicos) e o sul itálico como um eventual espaço privilegiado de diálogo artístico.


Sobre o autor:
Licenciado em Teologia (2005) pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa (Lisboa) e em História de Arte (2011) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Desde 2012 integra o projeto de investigação «Iluminura Hebraica Portuguesa durante o século XV», financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, preparando doutoramento nesta mesma área.






Para mais informação:
cartaz_coloquio_(1).pdf
(PDF PDF, 1 050 KB)

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